quinta-feira, 12 de maio de 2016

Carlos Pereira: “O governo Temer terá pouca liberdade para errar”

Ideias

O cientista político acredita que o novo governo precisa sinalizar que não tolerará corrupção e priorizará a retomada da economia

RUAN DE SOUSA GABRIEL- Época
12/05/2016 - 09h43 - Atualizado 12/05/2016 12h58
Cientista político e professor da Fundação Getúlio Vargas (Foto: Época )
O cientista político Carlos Pereira, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), acredita que Michel Temer tem condições de liderar um governo bem-sucedido, mas sua margem de erro será pequena. “Temer viverá sua lua de mel numa ilha sujeita a terremotos”, diz. Pereira afirma que Temer precisa sinalizar à sociedade que seu governo não será leniente com a corrupção e que não vai desmontar a rede de proteção social construída pelos governos petistas, mas que está comprometido com o ajuste econômico. Os dias do PT como partido de massas, diz ele, acabam com o governo Dilma Rousseff. “O PT tende a se tornar um partido de médio a pequeno no futuro próximo”.

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ÉPOCA – O governo Temer tem chances de dar certo?
Carlos Pereira – Sim, o governo Temer tem chances de dar certo. Esse governo nasce com legitimidade institucional e força política no Congresso, mas terá pouca liberdade para errar. É um governo que vai ter que implantar agendas aparentemente contraditórias. Por exemplo: uma agenda clara de estabilidade macroeconômica e retomada com desenvolvimento, a manutenção da rede de proteção social e combate à corrupção. Por essas ambições é que esse governo terá chances de entrar para a história. Esse governo tem as condições para ser bem-sucedido, mas viverá sua lua de mel numa ilha sujeita a terremotos. O desafio do governo Temer será governar num campo minado, onde podem acontecer várias coisas que podem fragilizá-lo.
ÉPOCA – Quais devem ser as prioridades imediatas do governo Temer?
Pereira –
Se esse governo conseguir reequilibrar a economia, sinalizar crivelmente que o pacote de proteção social oferecido pelo PT não está em risco e ofertar medidas de combate à corrupção, ele tem chances de dar certo. Se Temer não conseguir estabilizar a economia, colocar os programas sociais em risco e sinalizar, de forma dúbia, o combate à corrupção, o governo será um fracasso e tem chances de ser defenestrado como governo Dilma.
ÉPOCA – O próprio Temer e seus aliados são citados na Operação Lava Jato. A agenda anticorrupção tem chances de prosperar?
Pereira – Se não prosperar, será um suicídio político. A crença dominante do brasileiro hoje é uma clara intolerância à corrupção. Se o governo não se alinhar a essa crença, ele vai morrer muito cedo. Acredito que as crenças dos eleitores constrangem o comportamento dos políticos. Se Temer quiser sobreviver, terá de responder a essa demanda.
ÉPOCA – Dilma manteve uma relação desastrosa com o Congresso. A relação de Temer com deputados e senadores tende a ser mais harmoniosa?
Pereira – Não resta dúvida. O PMDB tem sido um partido de coalizão desde 1994. E tem a expertise para lidar com esse ambiente de coalizão. Temer terá todas as condições políticas para montar uma coalizão proporcional e na qual os parceiros dessa coalizão se sintam recompensados de acordo com seu peso no Congresso.
ÉPOCA – O Supremo Tribunal Federal determinou o afastamento de Eduardo Cunha. A saída de Cunha ajuda ou atrapalha Temer?
Pereira – Ajuda fundamentalmente. A importante punição de Cunha tira um fardo do governo, que não terá mais que levar em consideração as manipulações estratégicas dele. Foi um alívio. Perde-se uma liderança importante no Congresso, mas outras lideranças vão emergir logo.
ÉPOCA – Reformas como a trabalhista e a da Previdência são citadas como necessárias para o ajuste das contas públicas, mas são bastante impopulares. Essas reformas são realmente urgentes? Há um ambiente propício para a aprovação dessas reformas?
Pereira – Sim, essas reformas são urgentes. Por mais paradoxal que isso possa parecer, o governo Temer pode se nutrir da crise para galvanizar energia e suporte para aprovar essas reformas, que representam um custo para alguns setores da sociedade. Temer tem as condições de aprovar essas reformas, não há como prever seu comportamento. As condições políticas estão dadas, mas não sabemos se serão aproveitadas.
ÉPOCA – Como Temer pode se aproveitar da crise para aprovar reformas?
Pereira –
O argumento da crise pode ser utilizado para construir apoio. Quando se está numa situação calamitosa, como o Brasil, as pessoas suportam perder no curto prazo para ganhar no futuro. A crise pode servir de aliada ao governo Temer na luta para vencer resistências que certamente surgirão diante de iniciativas como a reforma da Previdência ou a trabalhista. O ambiente de crise pode ajudar o presidente a conseguir apoio para vencer essas resistências.
ÉPOCA – Quais os erros de Dilma que levaram ao seu impeachment?
Pereira – Inúmeros erros. Erros na gestão da coalizão, que era grande, heterogênea e desproporcional. Dilma não respeitava o peso político dos partidos e tratava mal os parceiros. Do ponto de vista macroeconômico, desde 2007, o governo petista tomou decisões equivocadas, interveio demais na economia, controlou os preços administrados, baixou os juros de forma unilateral, proporcionou subsídios a certos setores sem nenhum critério, maquiou dados, comportou-se de modo indisciplinado do ponto de vista fiscal, gastou mais do arrecadou... A lista de erros é interminável!
ÉPOCA – Ao longo do governo Dilma, o PMDB sempre reclamou que não era ouvido nem tratado como parte efetiva do governo pela presidente. Qual será o papel do PMDB no governo Temer?
Pereira –
O PMDB deixa de ser coadjuvante numa coalizão liderada ou pelo PT ou pelo PSDB para ser protagonista. É uma mudança de papel importantíssima, porque significa que o PMDB vai ter de arcar com os custos dos erros e com os louros dos acertos. Na condição de coadjuvante, ele era isento dos custos. Agora, como protagonista, o PMDB passa a ser mais suscetível a críticas, a ser vidraça. Mas, como o PMDB foi coadjuvante todos esses anos, ele sabe o quão difícil é ser coadjuvante e entende como é o jogo do presidencialismo de coalizão.
ÉPOCA – Depois de quase 14 anos, o PT não é mais governo. O que esperar do PT na oposição?
Pereira – Sou pessimista quanto ao futuro do Partido dos Trabalhadores. O PT vai encolher. Haverá uma debanda de políticos petistas, que vão procurar outras legendas. Só vão continuar aqueles políticos mais dependentes da estrutura e dos recursos do partido. Os políticos mais independentes e competentes vão procurar outras siglas. O PT tende a se tornar um partido de médio a pequeno no futuro próximo. Se o governo Temer for um fracasso, o PT ainda tem chances, mas, se o governo Temer for um sucesso, eu suspeito que o PT vai amargar um bom tempo na oposição.
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