segunda-feira, 18 de maio de 2015

O ministro da Defesa diz que o PT paga caro por ter feito proselitismo da ética na política

O ministro Jaques  Wagner em seu gabinete. “Meu padrão de ética não foi dado pelo PT, vem de antes da filiação” (Foto: Adriano Machado/ÉPOCA )
TEMPO

Jaques Wagner: “O pecado do pregador é mais dolorido que o do pecador”

LEANDRO LOYOLA E MURILO RAMOS - Época
18/05/2015 - 08h00 - Atualizado 18/05/2015 08h00
Jaques Wagner ainda não sabe quanto terá a menos para gastar neste ano. “Deve ser 50%”, diz. Orçamento curto não é novidade em sua Pasta, o Ministério da Defesa. A novidade é a sobrecarga de trabalho. Wagner terá de conciliar as complexidades de administrar a delicada área militar com uma ajuda constante na confusa seara política, na qual o governo é bombardeado continuamente. Nesta entrevista, Wagner avalia o estrago causado pela Operação Lava Jatoe o estado de seu partido, o PT, diante das manifestações nas ruas. “Fico triste que a bandeira seja o impeachment”, afirma.


ÉPOCA – O governo convive bem com as manifestações nas ruas?
Jaques Wagner –
 Convive. É óbvio que quem começou na rua, quando chega ao poder, acha que não vai ter mais rua. Não podemos ter essa ilusão. Eu acho que a gente sabe o que é rua, respeita. Mas fica surpreso com os protestos, porque você acha que está fazendo tudo certo. Acontece que a rua também vai evoluindo. O governo incluiu 40 milhões, mas não pode viver dessa conversa a vida inteira.
ÉPOCA – O que o senhor acha dos movimentos de rua pedirem o impeachment?
Wagner –
 Essa é a minha tristeza. Porque eu acho que, quando a sociedade vai para a rua, isso é uma energia democrática intensa. Minha tristeza é porque a única bandeira que até agora saiu é o impeachment – que não é uma bandeira propositiva, e sim uma bandeira negativa. Tirar para botar o quê? Para mim, essa energia toda, que emociona alguns, comove e assusta outros, deveria vir com uma bandeira diferente. Eu ia para a rua por salário mínimo, férias de não sei quantos dias. Agora, saem à rua para pedir impeachment. O impeachment está na regra do jogo. Mas não é a rua que faz impeachment. Quem faz impeachment é o Parlamento. Então eu acho que a energia não tem destinação. Vou chutar uma coisa que eu sou contra: eu sou presidencialista. Mas se a rua saísse com uma lógica “quero um novo referendo ou plebiscito para parlamentarismo”, era uma bandeira.
ÉPOCA – Em 1992, a bandeira das manifestações era só o impeachment.
Wagner –
 Era bem diferente. Você tinha uma figura e um entourage dentro do governo. Não adianta querer colar nessa senhora as questões que dizem respeito à ética na política. Sinceramente, é forçação de barra. Eu diria até que ela paga um preço, na política, por essa rigidez dela, essa intolerância com os malfeitos.
ÉPOCA – A Lava Jato atingiu o PT. O tesoureiro do partido foi preso por envolvimento com os desvios na Petrobras. A senadora Marta Suplicy saiu dizendo que partido traiu seus princípios. Como está o PT?
Wagner – 
A saída da Marta não se inclui nisso. Adoro ela, conheço o trabalho dela em São Paulo. Mas a saída da Marta é por espaço político. Sobre o PT: nós vamos encontrar um partido que seja detentor de toda a pureza imaginada? Não é por aí. Se quiser botar uma responsabilidade no PT, foi a gente não ter feito, assim que chegou ao poder em 2003, a reforma política, e mudado a máquina de fazer política do país.
"Nós vamos encontrar um partido que é o detentor de toda a pureza imaginada? Não é por aí"
ÉPOCA – O senhor acha que reforma política reduz a corrupção?
Wagner – 
O que eu quero garantir é que, quem queira entrar e fazer política num bom padrão, tenha espaço para fazer. Até porque eu acho que o PT, quando nasceu, achou que tinha o patrimônio da ética. Não tem. Meu padrão de ética não foi dado pelo PT, é de antes da filiação partidária. Você pode até perder seu padrão ao longo do caminho, porque aí o pecado atenta, e, se o cara não segurar a onda, vai embora. Mas você não pode imaginar que a democracia vai depender da minha, da sua honestidade. A democracia tem de depender de instituições, de transparência. Eu não vejo nenhum partido que possa se dizer dono da ética. Nós sempre fomos pregadores disso. O choque maior, em relação ao PT, é que o pecado do pregador é muito mais dolorido que o pecado do pecador.
ÉPOCA – O que o senhor acha do projeto da terceirização? O senhor deu declarações a favor do projeto recentemente, algumas delas contradizendo figuras de seu partido.
Wagner –
 Esse debate, desde o nome até a forma, foi sempre malfeito. Virou uma dicotomia. De um lado, o cara diz: “Só quer acabar com os meus direitos”; do outro lado, o cara diz: “Preciso especializar”. E está todo mundo mentindo. Tem gente que olha para a terceirização, o que eu acho meritório, dizendo: “Eu vou, para determinada função, contratar uma empresa que se especializou nisso”. Isso para mim é o jogo normal. Mas houve uma época, em que eu era sindicalista, em que houve terceirização e “quarteirização”. Se for por aí, com viés só de quem baba sangue e quer ver precarização de mão de obra como elemento de competitividade, aí eu estou fora porque isso não vai resolver nossa vida. Se for como especialização de serviços, para aumentar nossa competitividade e produtividade, aí tudo bem. Eu já vi grandes empresas que, por algum momento, acharam que terceirização era tudo. Depois de três, quatro anos, a empresa “desterceirizou”, porque a fidelidade do terceirizado com a empresa-mãe é diferente. O problema é que, toda vez que você bota um dogma e dicotomiza, terceirização sim ou não, acabou a conversa.
ÉPOCA – O senhor já sabe o tamanho do corte que será feito no orçamento da Defesa?
Wagner – 
Não, a presidente não bateu o martelo. Tudo aponta para um corte de 50%. Nós focamos nos projetos estratégicos: o submarino nuclear e a compra dos caças suecos Gripen, projetos de ponta, por conta da tecnologia e pelo que significam para as forças. Deter o submarino nuclear é mudar de patamar do ponto de vista da proteção das águas. No caso dos caças, a gente vai mandar 250 engenheiros para a Suécia para se especializar na operação deles.
ÉPOCA – O projeto do submarino nuclear é tocado por um braço da Odebrecht, uma empreiteira envolvida na Operação Lava Jato. Há algum efeito negativo?
Wagner – 
Não. Eu não senti nada de Lava Jato que impactasse aqui. Eu não quero minimizar o problema. Minha preocupação é preservar a economia. Se você descobriu uma laranja podre no saco, duas, três, quatro, dez, tira, joga fora para não contaminar. Mas não pode pegar o saco inteiro, com 95%, 97% de laranjas boas e jogar fora. A Justiça tem de punir quem cometeu o crime e pensar na economia brasileira. Na Alemanha, a Siemens (envolvida no caso do Metrô de São Paulo) foi chamada, pagou multa, e a vida continua. O assunto acabou em 90 dias. Tudo bem, teve problema de gestão na Petrobras. Eu nem diria que foi problema de gestão. Pegue um empresário em off, de uma grande empresa, e pergunte a ele assim: “Se tivesse um desvio feito por um gerente ou diretor seu, de 3%, você descobriria fácil?”. Esse caboclo estava investigando um posto de gasolina, bateu num doleiro, que por sinal era o mala de todo mundo para fora e para dentro. Ninguém descobriu nada diretamente na Petrobras. A Petrobras é auditada por Tribunal de Contas e tem auditoria externa, além de conselho fiscal. Caberia perguntar: “Ô, vocês ganham para auditar externamente, e aí? Tem dez, 12 anos essa brincadeira, e vocês nunca sacaram nada?”. Eu estou dizendo que não era óbvio, aquilo ali não era um balcão. “Diga aí, velho, quanto é: 3%?” Era muito mais sofisticado.

ÉPOCA – Como o senhor avalia a chegada do vice-presidente Michel Temer à coordenação política?
Wagner –
 Estamos em um ambiente tenso, mas que aponta para uma diminuição de tensão. Não sei se vai chegar a ser uma calmaria, aliás, nunca é uma calmaria. Mas Michel cumpriu um papel nesse processo de distensão, pela estatura que possui, pelo partido que representa. Temos agora um compartilhamento de governo, um destravamento do segundo escalão e uma compreensão melhor do ajuste fiscal. O fato é que ninguém vive de crise o tempo todo, nem governo nem oposição. Eu vivi o período de 2004 e 2005 com o presidente Lula. Parece que o mundo vai desabar, mas não desaba, pois o instinto de sobrevivência do político é preservar as instituições.
ÉPOCA – O governo já sabe o que querem Eduardo Cunha e Renan Calheiros?
Wagner – 
Essa pergunta é sinuca de bico, não tem resposta boa para dar. Eu prefiro responder: tratamos na nossa relação cotidiana em função das demandas que chegam. 

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