sábado, 21 de março de 2015

Especialistas preveem corte de 600 mil postos com carteira assinada neste ano

Resultado pode ser o pior desde 1996. Em fevereiro, 2,4 mil vagas formais foram fechadas

 postado em 21/03/2015 06:00 / atualizado em 21/03/2015 07:23

Brasília – O único dado positivo que a presidente Dilma Rousseff tinha na manga, o emprego, e que a ajudou vencer as eleições em 2014, está em risco. Pelas contas do economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, neste ano, serão fechadas mais de 600 mil vagas, o pior resultado desde 1996. Isso não ocorreu nem em 2009, no epicentro do furacão da crise financeira global estourada com a bancarrota do banco norte-americano Lehman Brothers, em setembro 2008.

“A recessão (em 2015) será mais profunda do que a do ano passado, que não tinha afetado tão intensamente a economia como neste ano”, afirmou. “O desemprego formal será o pior da série histórica. Na verdade, ele já está assim, pois o acumulado em 12 meses está em 221 mil. A virada está muito forte e não é difícil imaginar uma piora adicional de 221 mil para mais de 600 mil considerando que o cenário tende a ficar cada vez mais crítico”, emendou o economista. Pelas estimativas da MB, neste ano, o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro deverá encolher 1% e a inflação chegará em dezembro a 8% no acumulado em 12 meses, bem acima do limite de tolerância de 6,5% ao ano. “Esses dados podem ficar piores se a crise política se agravar e ainda houver racionamento”, pontuou.

Dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho, divulgados nesta semana mostram que foram fechados 2,4 mil postos de trabalho em fevereiro, o pior resultado para o mês desde 1999. Atualmente a indústria é o setor que mais vem demitindo. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) registrou queda de 0,1% no emprego da indústria em janeiro (leia abaixo). Pelas contas do economista Octavio de Barros, diretor do Departamento de Pesquisas Econômicas do Bradesco, apesar de algumas altas pontuais em fevereiro, março e dezembro do ano passado, o pessoal ocupado da indústria está em contração desde outubro de 2011. “A ocupação caiu 4,1% em janeiro (na comparação anual), mesmo montante registrado em dezembro do ano passado”, destacou.

Recessão 

O economista Carlos Alberto Ramos, professor do departamento de Economia da Universidade de Brasília (UnB), também acredita que este ano será o pior da história para o mercado de trabalho, de forma geral. “Haverá uma queda generalizada da atividade por conta da recessão no primeiro semestre e o emprego pode cair com mais força nos setores de serviços e no comércio nos próximos meses. A alta do dólar deve ajudar a indústria, que deverá conseguir exportar mais e isso ajudará a evitar mais demissões, com isso, haverá uma pequena melhora a partir do segundo semestre”, analisou. “Há uma deterioração do mercado de trabalho por dois fatores:o aumento da taxa de desemprego e uma maior informalização do mercado”, acrescentou. “Daqui para frente o setor andará na contramão’, avisou.

Na avaliação de Ramos e do economista-chefe da INVX Global Partners, Eduardo Velho, o brasileiro vai ver sua renda encolher e o poder de compra ficar cada vez menor diante da inflação elevada. “Os salários, em termos reais, vão cair e o poder de compra do consumidor brasileiro também. A taxa de câmbio valorizada vai afetar muito os preços dos alimentos. Logo, as classes mais baixas é que vão ser as mais atingidas”, destacou o professor da UnB.

Velho, da INVX, acredita que, neste ano, haverá ainda uma inversão do que ocorreu em 2012, quando os aumentos de salários dos trabalhadores bateram recordes acima da inflação. “Agora, certamente ocorrerá o inverso”, disse.

Reajuste a servidor desafia o governo

Brasília – A primeira reunião entre o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, e os servidores públicos federais, ontem, já sinalizou que as duas partes terão muitas arestas a aparar. Após mais de três horas de conversa com lideranças de 49 entidades sindicais, Barbosa disse que “a reunião foi bem produtiva”, mas descartou o reajuste linear de 27,3% – reivindicação da campanha salarial de 2015. “É inviável. Ultrapassa 1% do Produto Interno Bruto (PIB, soma das riquezas produzidas no país)”, resumiu. O aumento que o funcionalismo pede terá impacto negativo de R$ 70 bilhões nos cofres da União, valor 19,4% superior à meta de superávit primário do governo (economia para pagamento dos juros da dívida), de R$ 55,3 bilhões.

Barbosa foi incisivo no seu pronunciamento em vários pontos e deixou claro que não abrirá mão do ajuste das contas públicas. “Não há espaço fiscal. Qualquer aumento tem que caber no orçamento. Essa negociação envolve mais de um milhão de pessoas, não podemos prometer o que não temos disponível”, reiterou. Nos cálculos do funcionalismo, a fatura que vai cair no colo do Tesouro Nacional é bem menor do que a meta de superávit primário.

Rudinei Marques, do Fórum Nacional dos Servidores e presidente do Sindicato Nacional dos Analistas e Técnicos de Finanças e Controle (Unacon Sindical) , garantiu que o reajuste de 27,3% teria um impacto de R$ 40 bilhões e poderia ser escalonado para “não sangrar os cofres públicos”. Segundo Marques, a conta feita pelas 31 entidades que participaram do fórum não foi aleatória. “O percentual equivale à inflação oficial medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de agosto de 2010 a julho de 2016, em torno de 44%, já descontados os 15,8% ganhos em três parcelas (2013, 2014, 2015), mais ganho real de 2%”, assinalou o sindicalista.

O governo, disse Marques, tem em suas mãos os meios para garantir os recursos para contemplar os trabalhadores com os ganhos reais que eles desejam e ainda vai sobrar dinheiro. “Basta resgatar os R$ 100 bilhões desviados com a corrupção e estabelecer o imposto sobre grandes fortunas. São duas medidas simples. O Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita tem estudos que demonstram isso”, atacou.

Porém, ao contrário do que os servidores afirmam, Barbosa repetiu o discurso oficial, defendido desde 2010, de que, durante as duas gestões do ex-presidente Lula e da primeira da Dilma Rousseff, todas as carreiras tiveram ganho real de salário. “Muitas vezes depende do momento que é o ganho é considerado”, insistiu. Ele disse que não divulgaria, ainda, uma estimativa de percentual de aumento para os servidores, porque precisa primeiro saber como as receitas federais vão se comportar.

“Por enquanto, não defendemos número nenhum”. O cálculo, disse, será resultado de critérios rígidos, que levarão em conta o tamanho da arrecadação, do desenvolvimento econômico, do crescimento vegetativo da folha de pagamento e da nomeação de aprovados em novos e em concursos públicos em andamento.

Indústrias demitem

Rio de Janeiro – Após um mês de trégua, a indústria voltou a demitir trabalhadores em janeiro. Houve ligeiro recuo de 0,1% no número de empregados em relação a dezembro, segundo a Pesquisa Industrial Mensal de Emprego e Salário divulgada ontem, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Na comparação com janeiro do ano passado, o pessoal ocupado assalariado na indústria encolheu 4,1%, o 40º mês consecutivo de cortes de vagas. “Ou seja, são mais de três anos de quedas no total de ocupados na indústria”, ressaltou Fernando Abritta, economista na Coordenação de Indústria do IBGE.

O número de empregados no setor já está 9% abaixo do pico registrado em julho de 2008, pouco antes da crise econômica mundial. “A conjuntura continua desfavorável. A inflação alta ultrapassou o teto da meta do governo, os juros estão subindo desde 2013, a construção civil está desaquecida, a confiança do empresário continua em queda, a balança comercial negativa, os estoques seguem elevados”, enumerou Abritta. “Então o cenário não é favorável (para a indústria)”, completou.

Em relação a janeiro de 2014, o número de vagas diminuiu em 17 dos 18 ramos investigados pelo IBGE. Os setores que mais demitiram funcionários foram máquinas e aparelhos eletroeletrônicos e de comunicações (-11,3%), meios de transporte (-7,7%) e produtos de metal (-7,7%). O único setor a aumentar o número de postos de trabalho em janeiro foi o de produtos químicos, mas a alta foi de apenas 0,5% no total de ocupados em relação a um ano antes.

“A crise no mercado de trabalho da indústria brasileira permanece, portanto, bastante aguda. Observa-se também que ela é gera”, avaliou o Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi). O número de horas pagas aos empregados até registrou ligeira melhora (0,2%) em relação a dezembro, após uma sequência de oito meses de quedas. O indicador costuma sinalizar movimentos futuros da ocupação na indústria, uma vez que os empresários preferem primeiro calibrar o ritmo da produção através do aumento ou enxugamento da jornada de trabalho. Mas o IBGE ainda não vê sinal de melhora no indicador. “Ainda é muito cedo para falar em reversão (na tendência de demissão de trabalhadores)”, disse Abritta.

O valor da folha de pagamento real dos trabalhadores diminuiu 0,5% na passagem de dezembro para janeiro, sob influência do resultado negativo da indústria de transformação. No entanto, o segmento extrativo registrou um salto de 9,1%, explicado pelo pagamento de participação nos lucros e resultados em uma grande empresa do setor.

O recuo na folha de pagamento real deveu-se a resultados negativos em 14 dos 18 ramos investigados, com destaque para meios de transporte (-9,3%), máquinas e aparelhos eletroeletrônicos e de comunicações (-12,3%), produtos de metal (-10,8%), alimentos e bebidas (-2,2%), metalurgia básica (-4,8%), outros produtos da indústria de transformação (-7,2%), papel e gráfica (-3,8%), máquinas e equipamentos (-1,9%), borracha e plástico (-3,9%) e calçados e couro (-8,4%). Por outro lado, entre os três setores que apontaram resultados positivos no mês, o principal impacto foi assinalado por indústrias extrativas (6,7%).

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