sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Corrupção ocupa maior parte das investigações da PF

Entrevista

Leandro Daiello diretor geral da Polícia Federal

E-G
“Vale destacar nossos esforços no combate ao tráfico de pessoas, corrupção e pornografia infantil”
PUBLICADO EM 31/10/14 - 04h00
Responsável por comandar 14 mil policiais, o diretor geral da PF, em Brasília, conta, em entrevista a O TEMPO, que dos 146 mil inquéritos em andamento, pelo menos 200 são “investigações especiais”. Desses, os crimes de sonegação fiscal e de lavagem de dinheiro são maioria.
O amplo gabinete na cobertura do Máscara Negra – apelido da sede da Polícia Federal em Brasília – dá uma vista vazada para o Lago Sul, no horizonte, e o agitado setor de autarquias Sul. Condecorações entregues à instituição espalham-se por móveis estrategicamente distanciados para o fluxo da equipe, e o jovem ocupante do gabinete não dispensa os trejeitos gaúchos: saúda o visitante com um “tchê” e oferece chimarrão.
Engana-se quem considera o ambiente silencioso uma isolada ilha no coração de Brasília. Assim que acessa o prédio, qualquer visitante é monitorado por câmeras desde o térreo até a antessala.
É um “bunker” onde o diretor geral da Polícia Federal, delegado Leandro Daiello, comanda uma corporação com 14 mil policiais e mais de 2.000 delegados.
Atualmente, há 146.035 investigações em andamento na PF, número exato passado pelo próprio Daiello. Avesso a entrevistas – “não existe mais o papel de xerife”, diz –, o diretor abriu exceção e falou à reportagem de O TEMPO. Entre os diversos assuntos, a interface com o FBI – agência federal de investigação dos Estados Unidos – no combate a crimes cibernéticos e financeiros foi um deles. Só neste ano, agentes brasileiros capturaram 43 foragidos internacionais. Daiello também falou sobre o plano de realizar concursos anuais para as carreiras e sobre a implantação do inquérito eletrônico numa interface de poderes a partir de 2015.
Sobre a investigação de crimes de corrupção, o diretor da PF revela que entre as “200 investigações especiais em andamento”, grande parte está relacionada aos crimes de colarinho branco. Confira a seguir os principais trechos da entrevista.
Há notícias de que a PF atualmente comanda cerca de 100 mil inquéritos no país. Há pessoal suficiente para tanto?
Existem hoje em andamento no território nacional 146.035 investigações para um efetivo de mais de 14 mil policiais e administrativos. A constante abertura de concursos públicos nos últimos anos que será ampliada em razão da obtenção, pela Polícia Federal, da autonomia na abertura de novos certames, deverá tornar ainda mais eficiente a condução das investigações criminais pelas autoridades policiais a partir do aumento do efetivo.
Quantas são as investigações em andamento de combate à corrupção?
Temos aproximadamente 200 investigações especiais em andamento, grande parte delas no combate à corrupção. A corrupção é mais que desvio de verbas públicas. Nessas investigações somam-se as referentes a sonegação fiscal, crimes previdenciários, financeiros e de lavagem de ativos.
O que pode adiantar sobre o desenvolvimento do software E-Pol para a implementação do inquérito eletrônico, em elaboração com a Universidade Federal de Campina Grande (PB)?
O projeto E-Pol encontra-se na fase de implantação da versão Alpha do sistema, ou seja, a versão inicial com todas as funcionalidades necessárias à realização das investigações da Polícia Federal já está sendo testada pela Polícia Federal de Campina Grande. A previsão inicial para a implementação nacional é no decorrer de 2015, finalizando o treinamento e ajustes até o final deste ano. O sistema será capaz de pesquisar e verificar no momento de inserção de dados se existem informações preexistentes de investigações já em curso no território nacional que envolvam os mesmos autores e o modus operandi das quadrilhas, informação compartimentada e restrita aos policiais que participam dessas investigações, resguardado o sigilo dos demais dados.
A PF tem conseguido suprir investigações com pessoal e equipamentos no combate a crimes financeiros?
Sim, temos conseguido suprir essa demanda. Inclusive, recentemente foi criada uma operação permanente, com mobilização de policiais das unidades regionais, com vistas a suprir justamente as necessidades de pessoal especializado nas investigações de crimes financeiros e desvio de recursos públicos.
Como é a atuação na fronteira hoje? Há alguma região prioritária?
Atualmente as turmas formadas na Academia Nacional de Polícia têm como destino inicial as unidades de fronteira, principalmente Calha Norte e, com o recente Decreto Presidencial que criou o mecanismo de abertura de concurso sempre que houver 5% de cargos vagos a lotação de servidores nas fronteiras, poderá ser constantemente mantida e incrementada.
Em que âmbitos se dão hoje as interfaces da PF com o FBI e a Interpol?
Com o FBI, seguramente nas áreas de crimes cibernéticos, terrorismo e crimes financeiros, além de constantes intercâmbios no que se refere a treinamento e capacitação. Em relação à Interpol, a PF é a representante brasileira nessa relevante instituição, estrategicamente importante no combate à criminalidade transnacional pela capacidade de troca rápida de informações entre os países-membro.
Como e em que áreas a PF mais tem contribuído com outros países em investigações?
A PF tem contribuído com a captura de foragidos internacionais (só neste ano foram 43), levantamento de dados para instrução de investigações, tais como patrimônio, antecedentes criminais e, principalmente, como o nosso expressivo número de prisões e apreensões de drogas. Vale também destacar os nossos esforços no combate ao tráfico de pessoas, corrupção, pornografia infantil e crimes ambientais.
A Polícia Federal acaba de conquistar um certificado internacional de qualidade pelo Instituto Nacional de Criminalística (INC). Como isso pode facilitar o trabalho da PF?
Essa acreditação faz com que os resultados dos exames obtidos pelos nossos laboratórios sejam reconhecidos internacionalmente, adequando-se à tendência mundial de certificação de laboratórios forenses. Um exemplo prático é o compartilhamento internacional de perfis genéticos gerados pelo laboratório de DNA em casos específicos, que poderão ser confrontados com bancos de DNA de outros países via Interpol, expandindo a capacidade de investigação da PF. Significa que o Sistema de Gestão da Qualidade implementado pelos laboratórios do INC foi avaliado por uma instituição externa, isenta e independente. Também reforça a posição de vanguarda da Polícia Federal em políticas de segurança pública no Brasil.
Como o senhor lida com as questões internas das carreiras, principalmente de agentes e delegados?
Recentemente, apoiamos e trabalhamos para a edição da MP que garantiu aos agentes, escrivães e papiloscopistas a recomposição salarial e o reconhecimento do nível superior de suas atividades. Ao mesmo tempo, concentramos esforços para a edição da MP que dá mais autonomia à PF, ao reconhecer a ocupação da direção geral por um delegado federal posicionado na classe especial e também ao prever a participação da OAB no concurso para delegado de Polícia Federal. Essas medidas legislativas fortalecem ainda mais a instituição que desponta como uma das mais bem avaliadas pela sociedade.
O que se pode esperar para concursos na corporação?
A publicação do Decreto 8.326/2014 pela Presidência da República, que permitiu ao diretor geral a realização de concurso sempre que houver 5% de cargos vagos, implicará na possibilidade de planejamento do ingresso de novos servidores na Polícia Federal. O objetivo do órgão é preencher esses cargos no menor tempo possível, porém, sem perder a excelência na formação dos novos profissionais.

Nenhum comentário: