Brigas
PUBLICADO EM 19/10/14 - 04h00
A revelação, na última semana, de que a saída do fotógrafo uruguaio
César Charlone da produtora do cineasta Fernando Meirelles se deu por
motivos políticos colocou mais lenha na fogueira das discussões
eleitorais. Parceiros há dez anos nos sets de filmagens, Charlone apoia
Dilma Rousseff (PT), enquanto Meirelles atuou como consultor de Marina
Silva (PSB) no primeiro turno. Nesta segunda parte do pleito, o cineasta
não apoia ninguém.
A discordância entre os dois aconteceu em março, mas retrata algo comum
no fogo cruzado das eleições: os desentendimentos por causa de
política, que tomaram conta, principalmente, das redes sociais. “O clima
está muito acirrado, como nunca esteve. São coisas absurdas. Há
discussões em que tem argumento de lá, argumento de cá e, de repente,
alguém manda o outro ir tomar naquele lugar”, comenta a coordenadora do
Centro de Convergência de Novas Mídias da UFMG, Regina Helena. O
resultado, muitas vezes, são amizades rompidas.
O grupo das amigas Ana Paula e Kenia, por exemplo, criado na rede de
mensagens WhatsApp para reunir os velhos colegas de faculdade, ia muito
bem até o primeiro turno das eleições se aproximar. “Começou um monte de
bobagem. As pessoas começaram a postar montagens e charges sobre
candidatos. As coisas foram colocadas de tal forma que não era um
debate. Era como se fossem duas torcidas de futebol”, conta a bancária
Ana Paula Canela, 30.
“E o pior é que ambos os lados falavam mal do candidato oposto, para
evitar que você votasse em tal pessoa”, relembra a relações-públicas
Kenia Mara de Miranda, 35. O que antes era um lugar para conversas de
amenidades entre amigos virou palco de um verdadeiro “Atlético x
Cruzeiro”. O resultado foi que Ana Paula e Kenia deixaram o grupo,
seguidas por vários outros.
O empresário do ramo de informática e militante de longa data José
Célio Gabriel Martins, 61, também já viu alguns amigos virarem as costas
nas redes sociais. “Sou excluído na tréplica”, afirma, sobre os debates
com amigos que apoiam o partido oposto ao dele no Facebook. Ele, no
entanto, diz não se importar com a perda de audiência. “Nas redes
sociais, o debate é intenso. Se eu tiver tempo de ficar 24 horas por dia
no Facebook, eu fico. E 99% dos meus posts são políticos”, atesta José
Célio.
De acordo com a coordenadora do curso de Gestão de Campanhas Políticas
na Internet da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Luciana Salgado, o
ambiente virtual acaba liberando algumas amarras. “Como na web a pessoa
se sente mais livre, ela acaba perdendo os filtros. Se estivesse dentro
de um bar, pessoalmente, seriam obrigadas a manter a polidez”, afirma.
Da paz. Mas, em meio às discussões,
há também quem consiga manter as amizades, como é o caso do historiador
Mauro Teixeira, 40. Ele conta que já teve discussões pesadas sobre
política com os amigos, mas que, no geral, a conversa termina bem. E já
até aconteceu de a relação terminar melhor do que antes. “Outro dia, no
Twitter, comecei uma conversa meio áspera com um cara que não conheço,
e, no fim, estávamos conversando feito gente. Ele não mudou o voto dele,
nem eu mudei o meu, mas a conversa ficou em bons termos”, relembra.
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