Flávio Tavares/Hoje em Dia
Crescimento só com mudanças estruturais na economia do país
INSEGURANÇA – Representantes da indústria reclamam da desaceleração da economia e do consumo
O conjunto de indicadores negativos que desenham a situação econômica do país é, na opinião dos especialistas, um sinal claro de que mudanças estruturais deverão acontecer para que haja uma retomada do crescimento em 2015. As duas quedas consecutivas do Produto Interno Bruto (PIB) – que tende a ter o pior desempenho desde 2009 – e a alta carga tributária brasileira são os principais motivos de preocupação para executivos de finanças e dirigentes industriais.
Um ponto comum, apontado como medida urgente para reversão do quadro econômico, é a realização do ajuste fiscal. Em termo práticos, um esforço do governo Federal para gastar menos do que arrecada.
Para o pós-doutor em Economia e professor da PUC Minas Jean Max Tavares, a medida não é simples e se torna mais delicada em um período pré-eleitoral. “O ajuste fiscal implica em reduzir despesas de custeio e aumentar arrecadação, ou seja, aumentar os impostos. No momento atual, o governo não faria isso”, diz.
Outra dificuldade apontada por Tavares são os reflexos que cada ação pode gerar na esfera macroeco-nômica. “A taxa de juros Selic, por exemplo, pode ser aumentada para conter a inflação, mas se isso acontecer o investimento diminui. São fatores interligados”, avalia.
Produtividade
Um estudo do Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos (Depecom) da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), aponta que a produtividade física do trabalho da Indústria de Transformação caiu 0,7% em junho, na comparação com maio. Além disso, dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revelam que o índice anual de produtividade da indústria brasileira caiu de 0,1, em 2011, para -0,7 em 2012, voltando a crescer para 2,5, em 2013.
Para empresários do setor industrial, a produtividade instável é negativa para a economia, já que os custos com salários aumentam e não são acompanhados pelos preços do produtos. “Esse é o grande drama da indústria. Nós temos que crescer para ficar no mesmo nível. É como se estivéssemos subindo uma escada rolante que está descendo”, comenta o presidente da Cenibra, Paulo Rocha Brant.
Para Brant, o contexto justifica o ajuste fiscal como uma medida crível e sustentável. “Quando uma empresa quebra, os reflexos são pequenos. Quando o governo ‘quebra’, ele se volta contra nós, buscando mais tributos, impostos e taxas. Por isso que o equilíbrio fiscal é fundamental”, opina o empresário.
O economista Jean Max Tavares explica que em um cenário em que salários aumentam e a produtividade oscila, há inflação de custos. “Por outro lado, o trabalhador produtivo reduz o custo para seu empregador e isso pode ser divido entre o salário dele e o lucro da empresa. É esse o segredo do sucesso dos Estados Unidos, por exemplo”, comenta.
Futuro da economia desperta tanto otimismo quanto pessimismo
As opiniões se dividem entre executivos. De um lado, há quem acredite que o país tem fôlego para superar o mau momento e retomar o crescimento do PIB. Do outro, a perspectiva é de que a economia caminhe rumo ao abismo.
“A carga tributária elevada é um enorme problema e nunca entra na pauta de debates dos nossos governantes”, afirma o fundador e ex-presidente da locadora de veículos Localiza, Salim Mattar. “Eu acho que haverá aumento da carga tributária em 2015 porque será necessário um reajuste. O Estado, mais uma vez, se serve das empresas e da sociedade para resolver seus problemas de má gestão”, protesta.
Para o presidente da Federação das Indústrias dos Estados de Minas Gerais (Fiemg), Olavo Machado, a grande urgência econômica é uma política industrial clara, que garanta mais confiabilidade ao setor industrial.
“O imposto não é um problema do industrial, mas sim do governo. O governo tem que saber a carga que ele pode imputar à indústria e mantê-la competitiva”, opina.
Para Machado, a queda no PIB da indústria é recuperável desde que o governo crie estratégias de longo prazo, que deem possibilidades de reestruturação. “Não tivemos nenhum momento de desabastecimento no país, apesar de termos uma indústria que está definhando”, comenta.
CRESCIMENTO
O presidente do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças (Ibef), Carlos Alberto Teixeira de Oliveira, defende a necessidade de se estabelecer novas metas de crescimento econômico. “Temos que superar a média internacional. Buscar, no mínimo, um alinhamento com aquelas taxas contabilizadas pelos países emergentes”, sugere.
Por meio de uma ação conjunta, combatendo simultaneamente a inflação e os altos juros, o presidente da Dufry Brasil, Humberto Mota, afirma que é possível reverter o cenário atual. “O ajuste fiscal é, claramente, pré-requisito para que todos esses pontos sejam atacados de uma só vez”, opina.
O diretor do Ibef Minas Gerais, Laurindo Souza, ressalta que, apesar de arriscado, o ajuste vai ser crucial para definir a economia em 2015. “São muitos atores envolvidos, mas não há alternativa. O ajuste fiscal terá que ser feito, independentemente de quem ganhar as eleições”, conclui.
Dívida das famílias reduz o consumo
Um consenso entre economistas e empresários é de que o modelo da economia baseada no consumo pode estar com os dias contados. Simplesmente porque se o poder de compra diminui influenciado, por exemplo, pelo alto nível de endividamento das famílias, a economia sofre as consequências diretamente.
“Como o modelo econômico não é baseado no investimento, se o consumo cai o PIB cai. E a inflação, por sua vez, tende a subir”, comenta o pós-doutor em Economia e professor da PUC Minas, Jean Max Tavares.
Para o ex-ministro das comunicações Luiz Carlos Mendonça de Barros, o aumento do poder de consumo do brasileiro ao longo dos últimos anos ditou os rumos da economia. “O Brasil vive um ciclo econômico pelo qual já passaram as nações desenvolvidas. Mas com a vantagem de que a renda média cresceu muito”, comenta.
Ainda assim, Barros vê problemas sérios na economia. Para o ex-ministro, o país atingiu o limite do déficit fiscal, o que ainda vai adiar por algum tempo qualquer possibilidade de reforma tributária.
“Se o que se quer é reduzir impostos, é preciso reduzir, primeiramente, os gastos do governo”, argumenta. “E não dá pra olhar para o governo atual e acreditar que vai haver redução de gastos”, opina Barros.
Inflação
Se os gastos do governo estão altos, os das famílias brasileiras também estão. O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), medido pelo IBGE, subiu para 6,28% de acordo com o Relatório de Mercado Focus, divulgado em setembro pelo Banco Central.
“Hoje estamos no chamado estagflação. Há um baixo crescimento econômico com alta dos preços”, explica Tavares. “O cenário não é o melhor, mas também não é desolador. Temos condição de reverter a situação. Para isso precisamos de novos investimento que vão dar fôlego ao país”, completa o economista.