Congresso aprovou lei que dá a guardas civis tarefas de segurança pública.
MJ nega querer criar polícia municipal; Dilma tem até dia 8 para sancioná-la.
Guardas protegem prédio da Secretaria da Educação
de Ribeirão Preto (Foto: Valdinei Malaguti/EPTV)
de Ribeirão Preto (Foto: Valdinei Malaguti/EPTV)
O Ministério Público Federal e os comandantes das Polícias Militares do país contestam a constitucionalidade de uma lei,aprovada em julho no Congresso,
que amplia os poderes das guardas civis, estendendo a elas o poder de
polícia e também o porte de armas. A presidente Dilma Rousseff tem até o
dia 8 de agosto para sancionar a lei, com ou sem vetos.
Segundo o IBGE, em 2012, entre os 5.565
municípios do país, 993 possuíam guardas – 27 estavam em cidades com
menos de 5 mil habitantes.
Na prática, a nova lei autoriza esses
profissionais a atuarem não apenas na segurança patrimonial (de bens,
serviços e instalações), mas também na preservação da vida, na proteção
da população e no patrulhamento preventivo. Além disso, a lei atende à
reivindicação da categoria ao estruturá-la em carreira única, com
progressão funcional e ocupação de cargos em comissão somente pelos
próprios agentes.
Ao G1, o subprocurador-geral da República, Mario
Bonsaglia, afirmou que o texto cria “polícias municipais”, o que, no
entendimento dele, é proibido pela Constituição, que prevê que a tarefa
de segurança pública cabe exclusivamente aos estados e à federação.
“Minha impressão é que houve
extrapolamento do texto constitucional, que diz que as funções da guarda
são de mera proteção de bens, serviços e prédios municipais. Na
prática, ela vira polícia e aí temos uma violação. E o que é mais grave:
ser uma instituição armada sem o controle externo do Ministério
Público, pois a Constituição não prevê isso”, disse Bonsaglia, que
preside a câmara nacional do MPF responsável pelo controle externo da
atividade policial e do sistema prisional no país.
“Há um risco em, ao dar às guardas um
papel que extrapola suas funções, que haja interferência em políticas
locais”, destaca o subprocurador-geral da República, acrescentando que o
projeto de lei vai além dos limites da Constituição.
“Uma polícia municipal não pode ser
criada por projeto de lei, mas por proposta de emenda constitucional. Os
municípios não têm este poder”, diz Bonsaglia, que aguarda a posição da
Presidência para enviar ao procurador-geral da República, Rodrigo
Janot, uma análise da inconstitucionalidade do texto.
O Conselho Nacional de Comandantes-Gerais
das PMs também contesta a lei. “É evidente que melhorias na segurança
precisam acontecer, mas nos parece mais uma medida de cunho corporativo
do que uma solução para segurança pública”, afirma o presidente da
entidade, coronel Márcio Martins Sant’Ana, comandante da PM de Minas
Gerais.
Ele acredita que a lei pode atrapalhar em
vez de ajudar. “São grandes efetivos que podem não ter treinamento,
qualificação e controle para isso. Daí a solução vira problema”,
ressalta o comandante da PM de Minas Gerais.
Para o jurista Ives Gandra Martins, o
artigo 144 da Constituição aponta que segurança pública é
responsabilidade das policiais estaduais, federais e do Corpo de
Bombeiros. “Para que a guarda haja em suplementação às atividades da
polícia, é necessário uma emenda constitucional”, destaca ele.
Regulamentação
Segundo a secretaria nacional de segurança pública (Senasp), Regina Miki, o projeto de autoria do Ministério da Justiça tem por objetivo “regulamentar o que as guardas podem ou não fazer”. Ela negou a intenção de usurpações de funções das polícias estaduais e federais e a intenção de dotar de poder de polícia.
Segundo a secretaria nacional de segurança pública (Senasp), Regina Miki, o projeto de autoria do Ministério da Justiça tem por objetivo “regulamentar o que as guardas podem ou não fazer”. Ela negou a intenção de usurpações de funções das polícias estaduais e federais e a intenção de dotar de poder de polícia.
Guardas-civis posicionados na região da Rua 25 de
Março, em SP, durante protesto
(Foto: Glauco Araújo/G1)
Março, em SP, durante protesto
(Foto: Glauco Araújo/G1)
“Nosso objetivo não era transformar a
guarda em polícia. O que saiu do ministério foi um estatuto para
regulamentar as atividades que eles já estão fazendo e que não tinham
uma regulamentação”, afirma Regina.
Ela entende que o projeto de lei nº 39 de
2014 da Câmara, chamado de “Estatuto Geral das Guardas Municipais”,
traz “segurança para o profissional e para a sociedade”. “Não vou entrar
em pormenores do texto porque ainda tem que ser sancionado”.
O autor do projeto da lei na Câmara,
deputado Arnaldo Faria de Sá, afirmou categoricamente que a ideia era,
sim, transferir o policiamento aos municípios: “este realmente é o
objetivo, criar uma polícia municipal. As PMs são estaduais. Já as
guardas são locais e fortalecem o vínculo comunitário”, diz ele.
O porte de armas para a categoria é regulamentado pelo Estatuto do
Desarmamento, de 2003, que prevê que os municípios de mais de 50 mil
habitantes tenham direito a porte de arma institucional. A norma também
vale em cidades de regiões metropolitanas e capitais com mais de 500 mil
habitantes.
Positivo
Já o presidente da Associação Brasileira de Guardas, Ezequiel Farias, entende que a norma só regulamenta o que já está sendo feito na prática. “O que está escrito no texto é o que a guarda já executa no dia a dia, não é inovação nenhuma.”
Já o presidente da Associação Brasileira de Guardas, Ezequiel Farias, entende que a norma só regulamenta o que já está sendo feito na prática. “O que está escrito no texto é o que a guarda já executa no dia a dia, não é inovação nenhuma.”
Segundo Farias, “o que ocorre é que há um
lobby da PM, que quer monopolizar a segurança pública e acaba
prejudicando a população. Isso é um desserviço, tem trabalho para todo
mundo”. Ele aponta pontos positivos da lei, como a criação do número
telefônico nacional 153, exclusivo para atendimento do órgão.
Bruno Langeani, coordenador da ONG Sou da
Paz, aponta que a lei provoca um “vácuo onde ninguém está atuando”,
como a segurança de escolas e mediação de conflitos. Já o responsável
pela área na Viva Rio, o ex-comandante da PM do Rio Ubiratan Ângelo,
concorda que, na prática, em muitas cidades, a guarda já realiza ações
policiais.
“Com certeza elas não estão preparadas
hoje para isso, pois não foram criadas com este fim. Mas podem se
preparar. O texto comete um equívoco importante, ao me ver, ao dizer que
a guarda tem que ser obrigatoriamente uma instituição armada”, defende
ele.
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