06/08/2014 07:37 - Atualizado em 06/08/2014 07:37
Eugênio Moraes/Hoje em Dia
Comerciantes chineses já estão instalados em várias ruas e avenidas da capital, como na Paraná
Quem vai às compras no Centro de Belo Horizonte já percebeu que um novo
idioma é falado em muitas lojas: o mandarim. Por causa da saturação de
shoppings populares, como o Oiapoque, comerciantes chineses que há anos
identificaram a capital como polo de negócios, estão migrando para ruas
como Curitiba, Paraná, Rio de Janeiro, Carijós e avenida Afonso Pena,
segundo a Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL). De acordo com dados da
Polícia Federal, são 389 chineses residentes na capital.
“Eles buscaram lojas adjacentes ao shopping e foram se espalhando”, diz
Marco Antônio Gaspar, vice-presidente da CDL, que não tem dados sobre
quantas lojas da região central são de propriedade de empresários
chineses.
Certo é que, seja qual for a mercadoria ofertada – produtos
eletrônicos, acessórios e bijuterias – estão sempre à frente dos
negócios. Quando a língua parece ser um entrave, recorrem a mímicas e à
ajuda dos funcionários. “No, No, No” é o indicativo de que não querem
conversa ou negociação na hora da compra. Arredios, constantemente
conversam em mandarim para discutir preços ou reclamar, sem que os
clientes compreendam.
Dong Lin, de 43 anos, largou o emprego como médico, em Fujian, na
China, há seis anos, em busca de novas perspectivas. Primeiro, foi para
Recife. Em BH, escolheu um ponto próximo à rodoviária para montar um
comércio de variedades. Com dois filhos nascidos no Brasil, não pensa em
ir embora. “Aqui todo mundo é gente boa. Também gosto do clima”.
O português de Lin ainda é arrastado. Quando a conversa com os clientes
exige um pouco mais de palavras, ele recorre à “tradutora” Janaína
Almeida Silva, de 22 anos, amiga e funcionária. “Ele é muito
extrovertido e gosta de trabalhar. Às vezes, esquece, e começa a
conversar com a gente em chinês. Quando percebe que não estamos
entendendo, volta a falar em português”, diz Janaína.
Eletrônicos
Assim como Dong, Lin Maowu, de 32 anos, também não pensa em sair do
Brasil. Há dois anos ele mantém uma loja de produtos e acessórios
eletrônicos, na rua Curitiba. Já tentou morar na Espanha, mas não deu
certo. No Brasil, com esposa e o filho de apenas um ano, as coisas estão
melhores, garante. “Aqui é bom. O comércio está fraco, mas acho que vai
melhorar”.
O que faz Maowu acreditar no país, mesmo com o desaquecimento da
economia, são os brasileiros, “alegres e sempre de bem com vida”. Além
disso, Lin diz que aqui trabalha-se menos.
Li Chen, de 25 anos, apelidado de Nique pelos amigos, era sushiman nos
Estados Unidos. Veio para BH há quatro anos com a esposa, em busca de
melhores oportunidades. No comércio de variedades na avenida Paraná ele
vende de tudo um pouco: bolsas, lenços, capas de celular e maquiagem.
“Vamos ficar aqui porque é bom. A gente trabalha menos. Nos Estados
Unidos, o trabalho era pesado”.
Para ajudar na comunicação, Li também recorre a funcionários. Entre
eles, Fabiana Gonçalves, que trabalha com ele há mais de dois anos. “Eu
vim para a vaga e ele perguntou: quer trabalhar? Eu disse que sim e
comecei no outro dia. Agora, é tudo muito tranquilo”, contou.
Pesquisa aponta baixo impacto no comércio
A Federação do Comércio de Minas Gerais (Fecomércio) realizou uma
pesquisa, em novembro de 2013, com 104 donos de comércio varejista. A
pesquisa teve como objetivo mostrar o impacto dos produtos importados no
comércio da capital. Mais da metade (60,4%) disse não ter as vendas
prejudicadas com o aumento das lojas de importados. A grande maioria
(85,9%) também afirmou não deixar de comercializar algum produto por não
conseguir competir com os importados.
Segundo a pesquisa, metade dos comerciantes considera ter vantagem
competitiva no atendimento, devido à fama de mau-humorados dos asiáticos
e à dificuldade com o idioma.
O comerciante Sidney Soares Dias, de 40 anos, endossa a avaliação.
Conta que certa vez comprou uma caixa de som e tentou trocar, mas não
conseguiu. “Ele (o dono da loja) falou que não tinha troca e começou a
falar chinês. Até perguntei para a vendedora o que ele estava falando e
ela disse que não sabia, mas provavelmente estava reclamando”.
O médico Marco Antônio Félix também não gosta do serviço prestado.
“Nada do que comprei funcionou. O atendimento é péssimo, parece que
estão fazendo favor. Além dos produtos geralmente não serem de qualidade
e desestimular a indústria nacional”.
Já o psicólogo Breno Rocha Calábria já comprou vários produtos. Toda
vez que precisa de alguma coisa, liga para um comerciante chinês e faz a
encomenda. “Já comprei máquina fotográfica, filmadora. Tenho um contato
lá. O atendimento não é excepcional, mas é bom”.
Segundo o vice-presidente da CDL, Marco Antônio Gaspar, o
desaquecimento da economia na capital freou a expansão do comércio de
importados. “Hoje, nem vemos a procura deles por lojas”, diz.
Mesmo com a queda das vendas, ele avalia que os empresários chineses
possuem uma vantagem competitiva que faz com que permaneçam. “Eles
conseguem trazer produtos com preços competitivos e, por isso, continuam
em BH”.
Terceira língua mais procurada
Terceira língua mais procurada
O mandarim possui 20 mil caracteres e vários dialetos, o que torna a
compreensão ainda mais complicada. Diferente do português, é uma língua
tonal. Assim, o significado de uma palavra pode mudar dependendo do tom
utilizado.
Já é a terceira língua mais procurada nas escolas de idiomas, atrás do
inglês e espanhol. Além da gramática, as escolas oferecem aulas sobre
negócios e cultura chinesa. Os cursos têm duração média de três anos.
Pastel chinês com ingrediente brasileiro
GOVERNADOR VALADARES
Pioneira na emigração de brasileiros para o exterior na década de 80, a
cidade de Governador Valadares, no Leste do Estado, registra agora um
fenômeno inverso: a chegada de estrangeiros para investir e morar. Entre
esses imigrantes estão os chineses que se encantaram pelo Pico da
Ibituruna e o voo livre e caíram no gosto dos valadarenses com uma
receita milenar de pastel.
“A receita está em mandarim, mas os ingredientes são brasileiros”,
revela Kênia Yu, de 40 anos, nove deles em Valadares. Mãe de três filhos
e com uma lanchonete na esquina da rua Peçanha, coração comercial da
cidade, a comerciante não consegue quantificar, mas assegura que mais de
dez famílias chinesas adotaram a “capital do voo livre” como pátria.
Além deles têm ainda os japoneses, coreanos, portugueses, árabes e
americanos.
“Gosto do calor que faz aqui e dos paragliders voando do Pico da
Ibituruna. Os clientes são bons também. Gosto deles”, revela. A
estratégia de Yu para aprender a lidar com os clientes é contratar
funcionários brasileiros experientes e observá-los. O mesmo faz outros
três familiares dela com comércio em Valadares. “O português é difícil.
Vou ficar velha aprendendo essa língua de vocês”, brinca.
“É difícil (o português) para nós assim como o mandarim é para vocês”,
compara Ching Yu, outra comerciante da rua Peçanha que também apostou em
salgados e sucos para se estabelecer. De olho no caixa e com
dificuldade para conversar, Ching indicou o marido que tem uma revenda
de motocicletas e oficina de consertos na rua Afonso Pena para contar a
história da família que chegou primeiro ao Rio de Janeiro, há dez anos.
Mas ele não topou.
De acordo com a Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL), os chineses
investem principalmente em lanchonetes, restaurantes, lojas de artigos
diversos e confecções. Informou também que embora sejam “vários” os
estabelecimentos, apenas três estão cadastrados na CDL. “Trabalhamos
para conquistar a adesão dos demais”.
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