A queda do Boeing da Malaysia Airlines matou 298 pessoas.
A provável causa da queda – um míssil – mostra que a disputa territorial
na Ucrânia saiu do controle da Rússia
MARCELO MOURA, RODRIGO TURRER, VINICIUS GORCZESKI, ALINE IMERCIO, LEANDRO LOYOLA E MARCOS CORONATO
Derrubar um avião de passageiros, como o Boeing 777 do voo MH-17 da
Malaysia Airlines, atingido por um míssil na última quinta- feira, dia
17, é uma evidente barbárie contra as vítimas e seus familiares. Mas não
apenas isso. Politicamente, é um tiro de canhão no próprio pé. Matar
centenas de inocentes indefesos, de diversos países, acaba por unir o
mundo diante de uma posição – contra o responsável pela violência, tenha
ela sido intencional ou não. Em todos os episódios anteriores de ataque
contra aviões civis, o culpado saiu do episódio pior do que entrou.
Quando o líder da al-Qaeda Osama bin Laden mandou jogar duas aeronaves
contra as Torres Gêmeas, em 11 de setembro de 2001, condenou à morte a
sua causa e a si próprio.
O mundo provavelmente levará meses para saber em detalhes o que ocorreu ao Boeing que decolou às 12h15 (7h15, no horário de Brasília) da Holanda e caiu duas horas depois na Ucrânia, matando instantaneamente 298 pessoas. Ainda que o governo da Rússia tenha descartado qualquer responsabilidade pelo disparo do míssil que causou a tragédia (identificado pelos serviços de inteligência americanos como de fabricação russa), os olhos do mundo recaem, desde já, sobre o presidente russo, Vladimir Putin.
Putin é responsável por fomentar, com palavras, dinheiro e armas, os rebeldes separatistas que assumiram o controle do leste da Ucrânia, na fronteira com a Rússia, onde caiu o avião, e lutam pela independência. “Separatistas não têm como derrubar aviões militares sem equipamento sofisticado – e isso está vindo da Rússia. Se Putin decidir que não permitirá o fluxo de armamento pesado e homens para a Ucrânia, o fluxo cessará”, disse o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama. “Ele é quem mais teria controle sobre a situação – mas, até agora, não exerceu esse controle.”
A queda do avião, a dor dos parentes e os crescentes custos do conflito na Ucrânia – políticos, econômicos e, agora, até para a segurança da aviação internacional – contribuem para transformar em assunto global um conflito que começou internamente, se expandiu regionalmente e agora traga o mundo. Na sexta-feira, o Conselho de Segurança da ONU fez uma reunião emergencial para decidir sobre uma investigação internacional a respeito da queda do avião da Malaysia Airlines e para tentar controlar a troca de acusações entre russos e ucranianos. Cobrado a tomar medidas, Putin propôs um cessar-fogo entre os insurgentes e o governo ucraniano para amainar a crise.
>> Fotos: Destroços do avião da Malaysia Airlines no leste da UcrâniaO mundo provavelmente levará meses para saber em detalhes o que ocorreu ao Boeing que decolou às 12h15 (7h15, no horário de Brasília) da Holanda e caiu duas horas depois na Ucrânia, matando instantaneamente 298 pessoas. Ainda que o governo da Rússia tenha descartado qualquer responsabilidade pelo disparo do míssil que causou a tragédia (identificado pelos serviços de inteligência americanos como de fabricação russa), os olhos do mundo recaem, desde já, sobre o presidente russo, Vladimir Putin.
Putin é responsável por fomentar, com palavras, dinheiro e armas, os rebeldes separatistas que assumiram o controle do leste da Ucrânia, na fronteira com a Rússia, onde caiu o avião, e lutam pela independência. “Separatistas não têm como derrubar aviões militares sem equipamento sofisticado – e isso está vindo da Rússia. Se Putin decidir que não permitirá o fluxo de armamento pesado e homens para a Ucrânia, o fluxo cessará”, disse o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama. “Ele é quem mais teria controle sobre a situação – mas, até agora, não exerceu esse controle.”
A queda do avião, a dor dos parentes e os crescentes custos do conflito na Ucrânia – políticos, econômicos e, agora, até para a segurança da aviação internacional – contribuem para transformar em assunto global um conflito que começou internamente, se expandiu regionalmente e agora traga o mundo. Na sexta-feira, o Conselho de Segurança da ONU fez uma reunião emergencial para decidir sobre uma investigação internacional a respeito da queda do avião da Malaysia Airlines e para tentar controlar a troca de acusações entre russos e ucranianos. Cobrado a tomar medidas, Putin propôs um cessar-fogo entre os insurgentes e o governo ucraniano para amainar a crise.
Nesse complicado cenário geopolítico, o Brasil tenta se manter institucionalmente tão distante do conflito quanto está da Rússia e da Ucrânia na geografia. Desde o início da crise, o Itamaraty divulgou apenas uma nota em fevereiro. Documentos reservados do Itamaraty, obtidos e divulgados por hackers, mostram que a Rússia pediu apoio ao Brasil, durante uma das reuniões preparatórias da cúpula dos Brics, em março. “O chanceler (russo, Sergei) Lavrov discorreu sobre a intervenção russa na Crimeia (região da Ucrânia de ampla maioria russa)”, diz o texto enviado pelo embaixador do Brasil em Haia (Holanda), Piragibe Tarragô. “Lavrov pediu aos membros dos Brics que não apoiassem projeto de resolução apresentado pela Ucrânia na Assembleia-Geral.”
A presidente Dilma Rousseff decidiu adotar a neutralidade para não melindrar um importante parceiro comercial e evitar que Putin cancelasse a vinda à reunião dos Brics, na semana passada, em Fortaleza e Brasília. Na reunião, Dilma, na frente de Putin, falou de público sobre a crise ucraniana de forma suave. “Discutimos a multiplicação de conflitos regionais, especialmente no Oriente Médio. Tratamos os enfrentamentos na Síria, no Iraque e nas relações entre Israel e Palestina. Discutimos igualmente a situação na Ucrânia”, disse. “Lamentamos a falta de avanços concretos na maioria dessas situações e coincidimos que, em todas elas, soluções de longo prazo passam necessariamente pela via do diálogo, que depende do engajamento e do empenho de todas as partes envolvidas.” Por causa dos problemas do Brasil, como a economia em dificuldades, o governo Dilma não tem força política para fazer mais do que isso no plano externo.
Antes da derrubada do Boeing da Malaysia Airlines, o governo de Kiev já acusara jatos russos de derrubar um caça SU-25 ucraniano. Também divulgara que um míssil, “provavelmente disparado do território russo”, derrubara um cargueiro da Ucrânia e matara dois tripulantes. Embora o governo dos EUA diga ter informações de que o míssil que causou a tragédia foi disparado de uma região da Ucrânia controlada pelos separatistas (desde junho, há rumores de que eles se apossaram de um lançador de mísseis, antes pertencente às Forças Armadas ucranianas), é preciso investigar tais alegações com cuidado, porque há também uma guerra de informação em curso. Após a derrubada do avião, teorias conspiratórias que parecem tiradas de um filme de espionagem do período da Guerra Fria começaram a pipocar. Uma das versões noticiadas pela Tass, a agência de notícias estatal russa, sugeriu que o verdadeiro alvo do míssil era Putin. Outra teoria divulgada pelos russos diz que a Ucrânia disparou o míssil para incriminar os separatistas. O autor do atentado, seja quem for, muito provavelmente, cometeu um erro grosseiro de alvo. “Um avião de passageiros pode ser confundido no radar com um avião de transporte militar do mesmo tamanho”, afirma Igor Sutyagin, especialista em armamentos do Royal United Services Institute, de Londres.
Derrubar um avião de grande porte, em pleno voo, é um empreendimento que exige alto grau de sofisticação militar. O Boeing 777 seguia normalmente sua rota entre Amsterdã, na Holanda, e Kuala Lumpur, na Malásia. Voava a 33.000 pés (cerca de 10.000 metros) de altitude, perto do limite autorizado pelo governo da Ucrânia para o tráfego aéreo nos céus do país, quando foi abatido. Mísseis capazes de atingir um alvo móvel a tal distância são guiados por radar e transportados em veículos parecidos com pequenos tanques – as “baterias”. Sofisticado e de difícil manejo, o sistema antiaéreo Buk, popular na antiga União Soviética, dificilmente poderia ser obtido e operado por guerrilheiros sem o apoio de uma potência militar.
Qualquer que seja o culpado pelo disparo do míssil, a Rússia já tem responsabilidade por perder o controle da segurança aérea numa área de sua influência. Outros incidentes ocorreram nos últimos meses, como a derrubada, em junho, de um avião cargueiro ucraniano com 49 pessoas a bordo. Todos morreram. “Costumamos ver o céu como um espaço livre, mas não é verdade”, diz David Woods, consultor da investigação da queda do ônibus espacial Columbia e do voo Air France 447. “Os órgãos internacionais de aviação terão de reavaliar o risco de voar no espaço aéreo da Ucrânia e as melhores formas de evitá-lo.” Em 14 de junho, a autoridade de aviação do Reino Unido orientou as empresas aéreas a contornar a Ucrânia. Horas após a queda do avião da Malaysia Airlines, o governo da Ucrânia fechou seu espaço aéreo. Foi quase uma formalidade, uma vez que, voluntariamente, diversas empresas já haviam anunciado o desvio de suas rotas da região. O conflito na Ucrânia já produz consequências trágicas a 10 quilômetros de altitude. Se as lideranças mundiais não souberem agir para contê- lo, ele continuará a se alastrar.
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