domingo, 7 de abril de 2013

Maioria dos alvos da CPI do Narcotráfico não foi punida

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Investigações e indiciamentos não bastaram para penalizar policiais
Publicado no Jornal OTEMPO em 07/04/2013

GUILHERME REIS
FOTO: PAULO DE DEUS - 27.4.2000
Preservação. Policiais prestaram depoimento na CPI do Narcotráfico escondendo seus rostos
Policiais que foram alvo da Comissão Parlamentar de Inquérito do Narcotráfico da Assembleia de Minas, há 13 anos, se aposentaram normalmente e muitos sequer tiveram que responder a processos na Justiça mineira.
Em 1999, a Assembleia aprovou uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para averiguar as denúncias e os problemas crescentes do tráfico de drogas em Minas Gerais.
Um ano depois de ser instaurada, a chamada CPI do Narcotráfico, que contou com 12 deputados, se reuniu mais 50 vezes, ouviu mais de 121 pessoas e indiciou 53 indivíduos. Entre eles, apareceram os nomes de vários servidores públicos que tinham como responsabilidade manter a segurança pública, como policiais civis e militares.
Apesar de os deputados terem percorrido várias regiões do Estado e reunido evidências contundentes, a comissão não foi o bastante para fazer com que os agentes de segurança pública respondessem pelos atos na Justiça ou perdessem seus cargos por conluio com o crime.
Em Uberlândia, o inspetor da Polícia Civil Cesarino Ituassu foi denunciado por manter conexões com traficantes da região do Triângulo. O relatório final da CPI destacou que o policial suspeito possuía patrimônio muitas vezes superior à sua capacidade financeira. Cesariano era acusado de conceder proteção aos criminosos em troca de vantagem financeira.
Naquele mesmo ano, o policial sofreu sindicância da Corregedoria da Polícia Civil do Estado. Ele foi classificado pela instituição como elemento "pernicioso e criminoso". O inspetor, no entanto, não respondeu a nenhum processo na Justiça e se aposentou sem problemas.
Em Montes Claros, no Norte do Estado, o sargento da Polícia Militar Jacinto Paulo Pereira Faustino, por consequência da CPI, também foi alvo de uma sindicância da Polícia Militar por suposto envolvimento com o tráfico na cidade. A apuração não avançou.
Posteriormente, Jacinto pediu baixa da instituição e chegou a abrir uma empresa de segurança. Ele também foi proprietário do jornal "Gazeta Norte Mineira" de Montes Claros. Hoje, quem administra o periódico é seu filho. Atualmente, o ex-militar trabalha como advogado.
Em Belo Horizonte, outro caso de impunidade. O policial Civil Adelton Mauro de Vieira foi apontado como um dos pivôs da fuga do traficante Fernandinho Beira-mar do Departamento Estadual de Operações Especiais (Deoesp), em 1997.
O relatório final da CPI concluiu que a participação de Adelton Mauro foi preponderante para que Beira-Mar fugisse. Segundo o documento, por negligência, ele permitiu que outros presos ajudassem o traficante durante a evasão.
O policial, mesmo com a suspeita de ter cometido irregularidades, ainda está na ativa e não responde a nenhum processo na Justiça. As informações sobre os policiais civis foram confirmadas pela própria Corregedoria da Polícia Civil.
Promovido. Durante a CPI, outro caso chamou a atenção das autoridades. Em março de 2000, um traficante foi preso em flagrante em um estacionamento de um supermercado em Contagem, na região metropolitana. A ação da Polícia Federal prendeu também o capitão da Polícia Militar Marcelo Antonio Pio. Ele estava escoltando o criminoso.
O caso se tornou emblemático. Ele chegou a ser julgado e penalizado com seis anos prisão, porém, a decisão da Justiça foi reformada, e o processo dele foi extinto pela Justiça. Mesmo sendo alvo de investigação, Pio ainda subiu de patente. Ele se tornou major e chegou a trabalhar no setor de finanças da instituição. Agora, está aposentado.
Segurança
Secretário foi pressionado a se demitir
A CPI do Narcotráfico chegou a provocar a queda do secretário de Segurança Pública do então governador Itamar Franco. O gestor, Mauro Lopes (PMDB), foi acusado pela comissão de atrasar as investigações.
Consta no relatório da CPI, que a secretaria não apurou as denúncias com afinco a partir das informações repassadas pelos parlamentares. Os deputados, inclusive, creditaram a servidores da pasta o vazamento de dados.
A cisão entre os deputados e Lopes foi completa depois que a comissão pediu para que Itamar o demitisse. Como o governador não acatou, o então deputado Marco Régis enviou ao Palácio da Liberdade um dossiê sobre o secretário. O documento denunciava a proximidade de Lopes com um estelionatário do Sul de Minas, chamado Aquiles Caetano.
No fim de 2000, Lopes deixou o governo. Hoje, ele alega que saiu por não querer ver seu nome "sujado injustamente": "O Itamar pediu para que eu ficasse. Ele sabia que era armação. Durante a CPI, as portas da secretaria sempre estiveram abertas". (GR)
Quebra de sigilo
Fuga de Beira-Mar é incógnita
Um dos fatos que motivaram a criação da CPI do Narcotráfico, a fuga de Fernandinho Beira-Mar do Departamento Estadual de Operações Especiais (Deoesp), não foi completamente passado a limpo pelas investigações.
Em 1997, considerado o bandido "mais perigoso do Brasil", o traficante fugiu da carceragem da unidade da Polícia Civil sem maiores dificuldades. As circunstâncias levantaram a suspeita de que a ação foi planejada em conjunto com policiais.
O inquérito só conseguiu chegar ao nome do policial Adelton Mauro de Vieira, que ainda está na ativa e não precisou responder a qualquer processo judicial. Os outros dez oficiais que estavam trabalhando no dia não foram indiciados.
Um dos pontos ressaltados pelo relatório final da CPI é que "nenhuma das autoridades afetas à apuração dos acontecimentos solicitou a quebra do sigilo bancário de policiais do Deoesp, embora tivesse sido insistentemente veiculada uma versão segundo a qual o episódio teria envolvido corrupção". (GR)

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