quinta-feira, 18 de abril de 2013

Delegado ignorou decisão judicial que o impedia de manter contato com adolescente

Suspeito de atirar em menor dentro de carro no domingo foi indiciado por agredi-la em março

Paula Sarapu - Estado de Minas
Publicação: 18/04/2013 06:00 Atualização: 18/04/2013 07:10
 

A., que chegou a escrever o nome do casal nas costas de Toledo, revelou a uma amiga que ele queria pedir desculpa e reservou quarto de pousada em Lavras Novas
A., que chegou a escrever o nome do casal nas costas de Toledo, revelou a uma amiga que ele queria pedir desculpa e reservou quarto de pousada em Lavras Novas  (FACEBOOK/REPRODUÇÃO DE INTERNET)
Indiciado pela agressão à adolescente A.L.S., de 17 anos, o delegado Geraldo do Amaral Toledo Neto desrespeitou uma medida protetiva prevista na Lei Maria da Penha, decretada pelo Tribunal de Justiça em 3 de abril, ao se encontrar com ela em Conselheiro Lafaiete, no último fim de semana. A medida, que proíbe o contato dele com a jovem, foi proposta pela Delegacia Especializada de Proteção à Criança e ao Adolescente em 19 de março, quando ela fez um registro de ocorrência, acusando o policial de tê-la agredido com chutes e socos.
No sábado passado, porém, a adolescente revelou a uma amiga de Belo Horizonte que havia sido convidada por Toledo para um fim de semana romântico em Lavras Novas, distrito de Ouro Preto. Ela estava no salão de beleza em Lafaiete e se preparava para encontrar o delegado, que iria buscá-la na casa da mãe. Na noite de domingo, A. foi baleada na cabeça. O delegado alegou ao se apresentar na Corregedoria da Polícia Civil que a jovem havia tentado suicídio, mas foi preso como suspeito do crime.
O Estado de Minas localizou a amiga da adolescente. Ela conta que recebeu uma ligação de A. às 16h27 de sábado. “Ela estava feliz, disse que o Toledo queria pedir desculpa e que tinha reservado uma pousada para fazer um passeio muito bacana com ela. Eu disse para ela ter cuidado e até perguntei se ele não podia aprontar alguma coisa, já que ela tinha ido à delegacia. mas A. respondeu que estava tudo bem com eles”, diz a jovem, que esteve no hospital com a família de A. e pediu para não ser identificada.
Segundo a amiga, a mãe da adolescente era contra o relacionamento. “A mãe dela me disse que sabia que os dois se encontrariam no sábado, mas que não deu muita atenção porque estava ocupada com os outros filhos. A. me contou que voltou para Lafaiete para se libertar do Toledo, mas comentou que viria para BH no fim de semana e até pediu para ficar lá em casa.”
A adolescente foi baleada na cabeça no domingo, quando passava de carro com Toledo pela estrada que liga Lavras Novas a Ouro Preto. Ela permanece internada em estado grave no Hospital de Pronto-Socorro João XXIII (HPS), onde passou por cirurgia neurológica, segundo a assessoria de imprensa da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig).
Agressões
Depois do registro de agressão em 19 de março, A. foi incluída no Serviço de Prevenção à Violência Doméstica, da Polícia Militar, e recebeu duas visitas de policiais, nos dias 20 e 23, quando disse ter sido agredida em três ocasiões. A. informou ter encontrado o delegado no dia 22, porque ele queria que ela assinasse um termo desistindo da queixa.

 (FACEBOOK/REPRODUÇÃO DE INTERNET) Os amigos dela confirmaram o relacionamento do casal, inclusive no período em que ele trabalhou cobrindo a licença de uma colega na Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente, em julho de 2012. “Eles eram namorados, sim. Toledo a buscava todos os dias, depois do trabalho, no Shopping Paragem, e essa não foi a primeira vez que ele bateu nela. Ela já chegou para trabalhar com os dois olhos roxos. Ficou grávida dele e ele veio ao shopping ameaçá-la. Queria que ela tirasse o bebê e dizia que iria matá-la. Quando ela passou mal, uma gerente a socorreu numa unidade de pronto atendimento (UPA), mas o Toledo disse que não queria saber dela. Depois, mandou flores.” A. me contou que Toledo a levou a uma clínica para fazer o aborto”, afirmou uma funcionária de uma loja do shopping.
Um amigo do casal confirma a gravidez, mas não sabe dizer de quem foi a iniciativa do aborto. Segundo ele, A. tinha a chave do apartamento do delegado e ficou hospedada lá por quase um mês, período em que ele teria viajado ao exterior.
Recentemente, Toledo também deu “carteirada” para entrar com a adolescente numa boate no Bairro Funcionários. Diante da recusa dos seguranças da casa, ele afirmou que a menor era responsabilidade dele. “O relacionamento deles sempre foi muito conturbado, cheio de agressões. Ela queria largá-lo, mas o Toledo ameaçava. Na época da gravidez, no fim de janeiro, ela quis ir embora para Lafaiete, mas o delegado a convenceu a ficar.”
Afastamento por segurança
As determinações da medida protetiva e o inquérito em que Toledo foi indiciado por agressão correm em segredo de Justiça. Segundo o criminalista e professor de direito processual da Faculdade Dom Hélder Câmara André Myssior, o delegado não poderia ter se encontrado com a menor, mesmo se ela o tivesse convidado ou tenha aceitado entrar no carro dele por vontade própria. Segundo o especialista, quando o agressor viola qualquer medida protetiva, o juiz decreta sua prisão preventiva. Como o delegado já está preso, ele pode responder pelo crime de desobediência.
“As medidas protetivas pretendem impedir o agressor de se aproximar ou entrar em contato com a vítima. Há uma série de medidas, mas a que mais protege é o afastamento. O juiz pode ter proibido também qualquer contato por telefone ou meios eletrônicos”, explica o advogado, lembrando que a Lei Maria da Penha impede que a vítima retire a queixa. “Se a jovem estivesse atrás dele, ele deveria ter recorrido à Justiça pedindo a revogação da medida, mas não poderia encontrá-la de jeito nenhum: nem se ela convidasse, nem se ela aceitasse.”
Ex-namorada do delegado, a estudante de engenharia Paula Rafaella Maciel, de 24, garante que A. é quem perseguia Toledo. “Essa história da gravidez é invenção”, diz. Paula conta que o depoimento de Toledo à Corregedoria da Polícia Civil durou quatro horas, na terça-feira. De acordo com a ex-namorada, que continua amiga do delegado e também prestou depoimento, ele teria inclusive apresentado fotos de outras mulheres com quem se relacionava para mostrar que o relacionamento com A. não era sério. “Acabamos nos aproximando e ela sempre me dizia que a família não queria saber dela e que, se Toledo também não quisesse, ela iria se matar. Estamos em busca da verdade e não foi o Toledo que atirou nela.” A advogada do policial, Maria Amélia Tupynambá, não foi encontrada para comentar o caso.
Nessa quarta-feira, a Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa aprovou solicitação à Corregedoria da Polícia Civil para que Toledo vá depor sobre os crimes dos quais é acusado.
Delegado responde por vários crimes
O delegado Geraldo Toledo responde a processos em BH e no interior. Em 2007, foi denunciado na 5ª Vara Criminal por receptação, formação de quadrilha e adulteração ou remarcação de chassis, quando chefiava a delegacia de trânsito de Betim. O Ministério Público entrou com ação civil pública contra ele na 2ª Vara de Fazenda Pública Estadual por improbidade administrativa. Há também um processo de 2011 na comarca de Abre Campo, em que Toledo foi denunciado por estelionato. O MP o acusa de inserir declarações falsas nos documentos de registro de veículos em Mateus Leme, na Grande BH, assinando procedimentos de vistoria de caminhões inexistentes. O delegado teria ocultado ainda documentos de processos administrativos referentes ao emplacamento dos veículos. À época, ele estava na delegacia de São Joaquim de Bicas, na Grande BH. Em 2004, ele foi denunciado com a ex-mulher, a promotora Mônica Regina Rolla. À época, ele era delegado em Alfenas e foi acusado de invadir um estabelecimento sem ordem judicial e fazer uma prisão em flagrante por porte de uma arma, que teria sido plantada. O preso teria tido uma desavença com o delegado. A denúncia foi da Procuradoria Geral de Justiça, mas o crime prescreveu.

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