Redução
da maioridade penal para 10 anos, trabalho forçado para presos, aumento
do tempo máximo da pena para 50 anos (hoje é de 30 anos), prisão
perpétua para corruptos, castração química de estupradores. Estas são
algumas das sugestões populares destinadas ao endurecimento do novo
Código Penal recebidas pela comissão instalada pelo Senado, em novembro
do ano passado, que está concluindo o projeto definitivo de sua reforma.
Até a última semana, foram recebidas quase 2.500 sugestões populares.
O trabalho da comissão de juristas,
presidida pelo ministro Gilson Dipp, do Superior Tribunal de Justiça
(STJ), vai até o próximo mês, mas será apenas o início da discussão no
Congresso. As sugestões estão sendo recebidas pelo site do Senado e pela
linha do Alô Senado (0-800-612211).
Clamor público
A maior incidência de sugestões trata,
na parte geral do código, da redução da maioridade penal e da revisão da
legislação especial aplicável aos menores infratores; na parte
especial, da criminalização da homofobia e recrudescimento das penas,
especialmente quanto aos crimes contra a administração pública (por
exemplo, a corrupção); e, na execução, as
sugestões mais frequentes são para modificar o sistema progressivo do
cumprimento de penas, com ênfase em maiores exigências para a obtenção
do benefício.
“O clamor pelo endurecimento das leis
reflete o pensamento da sociedade sobre a segurança pública no Brasil”,
comenta o ministro Dipp. Ele vê na impunidade a causa desse sentimento
social. Mas ele ressalva que o endurecimento da lei não significa a
diminuição da criminalidade.
“Uma boa lei penal, condizendo com a
realidade do Brasil atual, é o ponto de partida, a base, a plataforma
para que as entidades envolvidas na segurança pública, no sistema de
prevenção e no sistema de penalização possam trabalhar adequadamente.
Mas só a lei não basta”, afirma o ministro do STJ. Ele destaca que é
preciso também uma mudança de mentalidade, maiores investimentos em
polícia técnica e, em remuneração,e no combate à corrupção nos órgãos
públicos. “É preciso, também, um Ministério Público dedicado e
aparelhado. E é preciso um Judiciário engajado e envolvido em ter
decisões justas, mas em tempo hábil”, adverte.
Pena justa
Para o relator da comissão de reforma do
CP, procurador regional da República Luiz Carlos dos Santos Gonçalves,
as manifestações recebidas pelos canais do Senado não demonstram
propriamente um desejo de vingança da população, mas um anseio por
justiça e pelo fim da impunidade. “A sociedade percebe que a lei penal
não é aplicada igualmente para todos, o que gera grande desconforto”,
avalia.
Ele acredita que nem sempre pena alta
significa pena justa, e que é compreensível que a reação imediata a um
crime violento seja o clamor por uma lei mais rígida. “Não podemos nos
esquecer de que o crime é sempre a violação do direito fundamental de
alguém: vida, incolumidade física, propriedade, liberdade, paz… A
violência e a fraude destroem sonhos, experiências, estilos de vida”,
explica Gonçalves.
Para o relator do anteprojeto do novo
CP, é por essa razão que a sociedade espera que o poder público faça
frente à criminalidade, evitando que a vida em sociedade seja a luta do
mais forte ou astuto contra os mais fracos. “Se há um crime violento ou
que causa grave lesão social e nada acontece, a confiança das pessoas no
estado democrático de direito fica abalada”, afirma.
Gonçalves pondera que as penas devem ser
proporcionais à lesão ao direito que o crime causa. “As penas brandas
ou que não são efetivamente aplicadas também são desproporcionais”,
avalia.
Sugestões
Toda sugestão enviada é apreciada pela
comissão, e serve de parâmetro para saber como pensa a sociedade. “O
código está sendo feito nos dias de hoje, mas projetado para o futuro,
num país extremamente plural, como é o Brasil”, explica o ministro Dipp.
Exemplos
Um morador de Propriá (SE) exprimiu
assim sua opinião sobre mudanças no Código Penal: “Os crimes estão
aumentando e ficando cada dia mais cruéis. Acho que não seria necessário
o aumento das penas máximas, mas sim o cumprimento integral delas.” De
Campo Novo de Rondônia (RO), chegou essa manifestação: “Espero que
aprovem leis mais severas para os crimes de homicídio; nosso país está
um caos, pessoas perdem a vida por motivos banais e o assassino não fica
preso porque as leis são muito brandas”.
O aumento do período máximo de
encarceramento para 40, 50 anos ou a prisão perpétua também estão entre
as dezenas de sugestões. Um morador de Juazeiro (BA) disse: “Sugiro
penas mais firmes, como por exemplo, castração química de estupradores e
pedófilos. Também a instauração da prisão perpétua para todos os crimes
hediondos”.
De Santa Maria (RS), um cidadão opinou
em sentido semelhante: “Aumentar a pena máxima para 50 anos ou para
prisão perpétua. Acabar com absurda progressão da pena que equivale à
quase impunidade. Progressão só depois de cumprir 85% da pena.”
Há também a defesa da pena de morte
(proibida pela Constituição) para as mais diversas situações. Da cidade
de São Paulo chegou esta sugestão: “Pena de morte para quem cometer
corrupção com dinheiro público”.
De acordo com o relator da comissão, a
participação dos cidadãos tem sido valiosa em vários sentidos, não só
para revelar opiniões, mas para indicar a necessidade de algumas
proteções penais. O procurador Gonçalves afirma que a comissão não tinha
atentado, por exemplo, para a importância da proteção dos animais
contra violências ou tratamentos cruéis e degradantes. “Foram os
cidadãos que, por meio do espaço na página do Senado, nos chamaram a
atenção para esta importantíssima questão”, conta.
Código moderno
Revisar um texto de lei escrito em 1940
não tem sido fácil para os 15 juristas que, voluntariamente, se esmeram
na tarefa de produzir o novo código, mais moderno. O procurador
Gonçalves explica que a modernidade buscada pela comissão é pragmática: a
capacidade da lei nova de dialogar com a sociedade, e fazer frente à
evolução das condutas criminosas.
“O tipo penal de formação de quadrilha
ou bando não supre a necessidade da previsão das organizações
criminosas; o estelionato não pode ser a resposta para todos os crimes
cibernéticos; o terrorismo precisa ser definido; o furto de uma bolsa
não pode ser equiparado à explosão de um caixa eletrônico; quem bebe não
pode dirigir; quem pratica racha ou pega deve arcar com as consequências desse tipo de irresponsabilidade”, comenta o procurador.
Da mesma forma que irá tipificar
penalmente novas condutas, o novo CP vai abolir do texto práticas que
pareciam graves quando da sua edição, mas que hoje não têm mais
relevância para a sociedade. “A evolução dos costumes foi extraordinária
nas últimas décadas. O Código Penal tem 72 anos. Alguns dizem que ele
já deveria estar aposentado compulsoriamente”, observa o ministro Gilson
Dipp.
Fonte:JB
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